Um dos elementos mais conflituosos existentes no cotidiano condominial refere-se justamente à famigerada taxa de mudança, sobretudo quando se trata de unidades colocadas à locação.
Pois bem.
A taxa de mudança tem natureza jurídica indenizatória, na forma dos artigos 186 e 927 do Código Civil, pois presume-se que durante o procedimento das mudanças ocorrerão danos às áreas comuns da edificação, além, ainda, da necessidade de reforço na limpeza e disponibilidade de um preposto do condomínio para acompanhar o ato.
A legalidade da referida taxa de mudança já foi por vezes questionada, tendo havido, no Tribunal de Justiça de Santa Catarina, por exemplo, decisões colidentes, algumas favoráveis e outras desfavoráveis à sua aplicabilidade.
A título de curiosidade, é interessante mencionar que no ano de 2017, na cidade de Curitiba/PR, a vereadora Maria Manfon apresentou um projeto de lei visando proibir a aplicação da taxa de mudança a todos os condomínios situados no perímetro municipal.
Utilize os formulários abaixo em seu condomínio:
Aqueles que combatem a cobrança da respectiva taxa de mudança, fundamentam sua insurgência no direito constitucional de ir e vir, estabelecido pelo inciso XV do artigo 5º da Constituição Federal, além da hipótese de enriquecimento sem causa, encartada no artigo 884 do Código Civil, bem como nos danos gerados à relação social interna do condomínio, conforme colhe-se do trecho do julgado proferido na Apelação Cível 2.558 do TJSC, abaixo colacionado:
“Se há previsão de indenização para a hipótese de causação de danos ao bem condominial, qual o motivo da imposição do pagamento de uma taxa de três salários mínimos para mudanças dos locatários, tanto para as entradas, como para as saídas?”, questiona o magistrado. Para ele, a taxa existe somente para garantir “um lucro injustificado ao complexo condominal”.
Já os que defendem a aplicabilidade da taxa de mudança, argumentam a necessidade de pré-fixação das indenizações incidentes sobre as mudanças realizadas nas dependências do condomínio, notadamente ante a dificuldade de comprovação de todos os pressupostos ensejadores da responsabilidade civil (dano, nexo de causalidade e culpa).
Os defensores da validade da taxa em tela salientam que o valor cobrado deve ser módico e suficiente para reparar pequenos danos ocorridos durante os transporte do mobiliário das unidades, sob pena de ser considerado abuso de direito, a teor do artigo 187 do Código Civil.
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Nesta linha de raciocínio, nos casos práticos, se for possível comprovar todos os elementos caracterizadores da responsabilidade civil, assim como quantificar o dano havido durante o processo de mudança, na forma do artigo 944 do Código Civil, o qual estabelece que “a indenização mede-se pela extensão do dano”, o condomínio deverá optar por cobrar a indenização efetiva ao invés da aplicação da taxa, mitigando, destarte, maiores discussões acerca do ocorrido.
Em que pese as duas correntes de entendimento citadas anteriormente, se o condomínio optar por adotar a cobrança da taxa de mudança em seu perímetro, é imprescindível que haja previsão em seu regulamento interno, bem como todas as hipóteses de aplicabilidade, conforme enfatizado no julgado colhido do TJRS, abaixo trasladado:
AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO. TAXA DE MUDANÇA. A TAXA DE MUDANÇA CONSTA NO REGISTRO INTERNO, QUE FOI APROVADO EM ASSEMBLEIA EXTRAORDINARIA, LOGO É DEVIDA. AFASTAR SUA COBRANÇA SOMENTE ATRAVÉS DE UMA AÇÃO ANULATORIA. APELO PROVIDO. (Apelação Cível Nº 198054348, Décima Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Silvestre Jasson Ayres Torres, Julgado em 08/04/1999)
No mesmo sentido, segue a orientação do TJPR:
CONDOMÍNIO RESIDENCIAL. COBRANÇA DEVIDA. PREVISÃO NO REGIMENTO INTERNO DO CONDOMÍNIO. ABUSIVIDADE NÃO VERIFICADA. SENTENÇA REFORMADA. Recurso conhecido e provido. 1. Trata-se de ação de indenização por danos morais e materiais em que alega o reclamante que quando estava realizando a sua mudança para o condomínio reclamado, foi impedido de entrar, sendo exigido o pagamento da taxa de mudança de R$ 252,00 diretamente à empresa que administra o condomínio, o qual aduz ser abusivo, sendo exposto a situação vexatória. 2. Sobreveio sentença julgando parcialmente procedente o pedido inicial, condenando o reclamado à restituir o valor de R$ 252,00 ao reclamante (evento 20.1). 3. Inconformado o reclamado interpôs recurso inominado requerendo, em síntese a reforma da sentença, aduzindo que há previsão no regimento interno para a cobrança da mencionada taxa (evento 26.1). 4. Em que pese o entendimento do Juiz sentenciante, não verifica qualquer ilegalidade na cobrança da taxa de mudança, vez que prevista no regimento interno do condomínio e, portanto, aprovada por todos os condôminos. 5. Assim, para que houvesse a entrada do recorrido no condomínio, era imprescindível o pagamento da referida taxa, de modo que incumbia ao proprietário do imóvel alugado pelo recorrido informar quanto as regras do condomínio recorrente. PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ 1ª TURMA RECURSAL – PROJUDI Ante o exposto, esta Turma Recursal resolve, por unanimidade de votos, CONHECER e DAR PROVIMENTO ao recurso interposto, nos exatos termos deste vot (TJPR – 1ª Turma Recursal – 0000348-95.2015.8.16.0058/0 – Campo Mourão – Rel.: FERNANDA DE QUADROS JORGENSEN GERONASSO – – J. 14.07.2016)
Importa mencionar que a legislação condominial é composta por apenas 27 artigos (1.331 ao 1.358 do Código Civil), os quais funcionam como “a espinha dorsal” da vida condominial, eis que o saudoso professor Caio Mário da Silva, ao conceber a Lei 4.591/64, teve a sensibilidade de reconhecer que cada condomínio é uma pequena sociedade, e que são formados por pessoas e para pessoas, motivo pelo qual os seus acordos de vontade constantes na convenção e no regulamento interno devem ser respeitados por todos os condôminos e moradores, atuais e futuros, desde que não contrariem a legislação hierarquicamente superior, tais como o Código Civil e a Constituição Federal.
Então, se o regulamento interno do condomínio possui a previsão de aplicabilidade da taxa de mudança, e tendo sido legitimamente votada em uma assembleia especialmente convocada para esta finalidade, a cobrança da taxa é legal.
Conhecer o regulamento interno e a convenção é um dos grandes segredos de sucesso para o gestor condominial, assim como é para o morador um elemento indispensável para conviver harmonicamente junto ao seio social escolhido por si.
Ao optar por residir em um condomínio, o morador subscreve tacitamente um contrato social, por meio do qual ratifica todas as normas de convivência aplicáveis àquela determinada sociedade submetendo-se ao cumprimento delas, ainda que não tenha participado de sua concepção.
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Gustavo Camacho é advogado, sócio da Camacho Advogados, pós-graduado em direito processual civil, pós-graduado em direito Civil e empresarial, LLM em direito empresarial, pós-graduando em direito Imobiliário, líder coach, diretor jurídico adjunto da ASDESC, presidente da comissão de direito do consumidor da OAB Joinville, articulista de jornais e revistas especializadas em condomínios.
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