Publicado em 30 de novembro de 2023
O STJ e a Proibição da Locação de Imóveis por Airbnb. Entenda a polêmica decisão do STJ e se realmente foi proibida a disponibilização de imóveis via Airbnb em condomínios residenciais.
Entenda a polêmica decisão do STJ e se realmente foi proibida a disponibilização de imóveis via Airbnb em condomínios residenciais.
Em julgamentos de grande relevância para o crescente ramo da economia compartilhada [1], o Superior Tribunal de Justiça (STJ), nos recursos REsp n. 1.819.075/RS e REsp n. 1.884.483/PR, estabeleceu que a “locação” de imóveis por plataformas como Airbnb e similares (Alugue Temporada [Home Away], Vrbo, Booking.com e outras) pode ser submetida a restrições decorrentes de normas contidas nas convenções de condomínio. [2]
Interpretações equivocadas desses precedentes têm causado inquietação entre proprietários de imóveis e usuários dessas plataformas digitais. Muitos se perguntam: será que estamos diante de uma proibição ampla e irrestrita da “locação” de imóveis via plataformas digitais em condomínios residenciais? A resposta, surpreendentemente, não é tão simples quanto parece. Vamos desvendar os detalhes dessas decisões judiciais e entender o que realmente está em jogo neste cenário em constante evolução.
Decisão da Quarta Turma do STJ no REsp 1.819.075
A controvérsia surgiu após um condomínio de Porto Alegre ajuizar uma ação contra proprietários que alugavam suas unidades por meio do Airbnb. O ponto central é que a convenção do condomínio previa a finalidade residencial para os imóveis e as atividades de “locação” foram consideradas comerciais, portanto, proibidas pela convenção.
É importante ressaltar que a convenção não possuía vedação expressa para “locação” dos imóveis via Airbnb. Ela somente estipulava a finalidade residencial para o condomínio.
O STJ decidiu manter a decisão que proibia a disponibilização dos imóveis via Airbnb, pois se entendeu que os proprietários estavam, na verdade, negociando contratos atípicos de hospedagem. A fundamentação jurídica utilizada destacou que, no caso concreto, as atividades eram comerciais, não podendo ser exercidas em um condomínio residencial.
O Ministro Raul Araújo enfatizou que a forma de utilização do imóvel pelos recorrentes alterava a finalidade residencial do edifício, podendo causar ameaças à segurança e ao sossego:
“A forma de utilização do imóvel pretendida pelos recorrentes altera a finalidade residencial do Edifício, exigindo relevantes adaptações na estrutura de controle de entrada e saída de pessoas e veículos do prédio, sob pena de ensejar potencial ameaça à segurança e ao sossego de todos.”
Sobre a natureza jurídica do contrato em questão, o Ministro esclareceu que se trataria de um “contrato atípico de hospedagem”[3]. Esta modalidade [4] é distinta das formas convencionais de locação [5] de imóveis ou hospedagem [6] em estabelecimentos como hotéis. Assim, a embora não seja ilícita, por ter um caráter comercial ela não poderia ser praticada em condomínios residenciais, salvo autorização expressa da convenção [7].
Decisão da Terceira Turma do STJ no REsp n. 1.884.483
Nesse caso, foi analisado o recurso em uma ação de anulação de assembleia condominial que havia proibido a locação dos imóveis por períodos inferiores a 90 dias, especialmente via plataformas como Airbnb. O autor do recurso alegava que tal proibição violava o seu direito de propriedade, enquanto o condomínio defendia a manutenção da natureza residencial do imóvel e proteção do sossego e segurança dos demais condôminos.
A questão difere um pouco do precedente citado anteriormente, pois aqui existe proibição expressa da locação dos imóveis por curto prazo. A Turma entendeu que não havia ilegalidade ou falta de razoabilidade na restrição imposta pela assembleia do condomínio, pois cabe a ela decidir sobre a conveniência de permitir a locação das unidades por curto período, observando a destinação prevista na convenção condominial e a função social da propriedade.
Interpretação e alcance das decisões do STJ sobre”locação”via Airbnb em condomínios residenciais
Os mencionados precedentes têm gerado debates significativos. Ao analisarmos conjuntamente os casos dos REsp 1.819.075/RS e REsp n. 1.884.483/PR, notamos pontos importantes que ajudam a entender a posição do STJ sobre o assunto.
No REsp 1.819.075, julgado pela Quarta Turma do STJ, não havia uma proibição expressa na convenção do condomínio contra a locação por curto espaço de tempo via plataformas digitais. A decisão foi tomada apenas levando em conta a finalidade residencial do condomínio e a natureza da atividade exercida. O caso envolvia várias peculiaridades [8] que levaram os ministros a entender que a negociação tinha finalidade comercial. No entanto, isso não implica que toda locação via Airbnb seja automaticamente categorizada atividade dessa natureza.
Já no REsp n. 1.884.483, a Terceira Turma do STJ analisou um cenário em que a proibição de locações por períodos inferiores a 90 dias estava expressamente prevista na convenção do condomínio. Aqui, a discussão girou em torno da legalidade dessa restrição e seu alinhamento com a função social da propriedade e a destinação residencial do condomínio.
Em ambos os julgamentos, os ministros enfatizaram um ponto crucial: não é a forma de disponibilização do imóvel ao público (por plataformas digitais ou não) que define a natureza jurídica da atividade [9]. O que importa são as características e peculiaridades da”locação”e se ela respeita ou não as regras estabelecidas pela convenção condominial e pela legislação pertinente [10].
Assim, com base nos precedentes estabelecidos pelo STJ, é possível concluir, com certa segurança, que:
- Natureza Comercial e Condomínios Residenciais: Se evidenciado que a “locação”, intermediada por plataformas como o Airbnb ou até por meios tradicionais (jornais, panfletos, corretores de imóveis etc.), possui características comerciais, ela é vedada em condomínios residenciais.
- Plataformas Digitais e a Natureza da Atividade: O uso de plataformas digitais como Airbnb, por si só, não define atividade como comercial. É possível disponibilizar imóveis via plataformas digitais, para estadia por curta duração, sem que isso configure atividade comercial. O que determina a natureza comercial são as características operacionais especificas do caso.
- Restrições de Convenção Condominial: As convenções de condomínios residenciais podem impor restrições a locações de curta duração.
Conclusão: o STJ proibiu o Airbnb em condomínios residenciais?
É importante reconhecer que esta novel atividade econômica tem uma expressiva repercussão social, estando inserida na emergente economia de compartilhamento. Neste contexto, não devem ser feitas previsões alarmistas sobre proibições que efetivamente não existem. As locações via plataformas como Airbnb representam uma importante faceta da economia moderna, facilitando o acesso a acomodações e oferecendo oportunidades econômicas para muitos proprietários.
Os precedentes citados, referentes aos casos específicos julgados pelo STJ, não foram unânimes, não são vinculantes e valem apenas para as situações ali decididas.
Embora possam orientar juízes e tribunais na tomada de decisões em casos futuros, as decisões não são suficientes para afirmar que houve a formação de uma jurisprudência no sentido de proibir de maneira geral a locação de imóveis via Airbnb em condomínios residenciais. Cada caso possui suas especificidades e deve ser analisado individualmente, considerando as regras da convenção de cada condomínio, o contexto em que a”locação”ocorre e as peculiaridades do caso. Apenas nos casos de proibição expressa na convenção do condomínio é que estaremos diante de um quadro maior de certeza quanto à vedação.
O tema carece de maiores estudos e aprofundamentos por parte da doutrina e da jurisprudência, reforçando a demanda por uma compreensão jurídica mais densa e atualizações legislativas para enfrentar os desafios e oportunidades desse setor em crescimento.
Julgados em referência:
REsp n. 1.819.075[11]
REsp n. 1.884.483[12]
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[1] A economia compartilhada é um modelo econômico em que recursos como bens e serviços são compartilhados entre pessoas, normalmente por meio de plataformas digitais. O Airbnb (e similares), que permite a proprietários alugar imóveis por períodos curtos, é um exemplo desse modelo, compartilhando recursos de hospedagem.
[2] A convenção de condomínio é um documento que define as regras e normas para a gestão de um condomínio. Ela abrange a administração, as relações entre condôminos, o uso das áreas comuns e privativas, o processo de tomada de decisões em assembleias, e o rateio de despesas. O Código Civil permite que a convenção inclua regras adicionais conforme a necessidade dos condôminos, tornando-a um instrumento flexível e adaptável (arts. 1.332, 1.333 e 1.344 do Código Civil).
[3] “No caso dos autos, tem-se um contrato atípico de hospedagem, expressando uma nova modalidade, singela e inovadora de hospedagem de pessoas, sem vínculo entre si, em ambientes físicos de padrão residencial e de precário fracionamento para utilização privativa, de limitado conforto, exercida sem inerente profissionalismo por proprietário ou possuidor do imóvel, sendo a atividade comumente anunciada e contratada por meio de plataformas digitais variadas.” (trecho do voto do Ministro Raul Araújo)
[4] Neles, como assevera o voto, a atividade é comumente anunciada e contratada por meio de plataformas digitais variadas e caracteriza-se por hospedar pessoas que não têm vínculos entre si em imóveis de natureza residencial. O uso do imóvel é fracionado, permitindo a ocupação privativa de partes dele, como um quarto, por exemplo. A atividade é realizada pelos proprietários ou possuidores do imóvel sem um caráter profissional intrínseco, diferenciando-a de serviços de hospedagem tradicionais.
[5] Regidas pela Lei 8.245 5 5 5/91. Não há enquadramento nem mesmo na chamada “locação para temporada” (art. 48 da Lei de Locações), pois esse tipo de contrato não pode ser feito de maneira informal e fracionada de apenas alguns quartos.
[6] Dispostos na Lei nº 11.771 1 1 1/2008 e que se refere a contratação de hotéis e pousadas tradicionais. No contrato típico de hospedagem, um hospedeiro (como um hotel) fornece alojamento e serviços relacionados a um hóspede, por um período e preço determinados, com um grau de profissionalismo e sob regulamentações específicas do setor hoteleiro.
[7][…] 9. Não obstante, ressalva-se a possibilidade de os próprios condôminos de um condomínio edilício de fim residencial deliberarem em assembleia, por maioria qualificada (de dois terços das frações ideais), permitir a utilização das unidades condominiais para fins de hospedagem atípica, por intermédio de plataformas digitais ou outra modalidade de oferta, ampliando o uso para além do estritamente residencial e, posteriormente, querendo, incorporarem essa modificação à Convenção do Condomínio. […]( REsp n. 1.819.075/RS, relator Ministro Luis Felipe Salomão, relator para acórdão Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 20/4/2021, DJe de 27/5/2021.)
[8] Por exemplo, a subdivisão do imóvel com o intuito de acomodar mais pessoas,” como se um hostel fosse “, ainda que despido das formalidades legais e até a locação da mesma unidade autônoma a diversos indivíduos que não mantinham nenhum vínculo entre si e a quem eram prestados serviços de lavanderia e de acesso à internet, tanto por períodos curtos quanto por períodos superiores a 12 (doze) meses.
[9] […] 4. A forma por meio da qual determinado imóvel é disponibilizado para uso de terceiros não é o fator decisivo para que tal atividade seja enquadrada em um ou outro regramento legal. […] ( REsp n. 1.884.483/PR, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 23/11/2021, REPDJe de 02/02/2022, DJe de 16/12/2021.)
[10] “Portanto, creio que haveria um equívoco se este julgamento fosse divulgado de modo a vincular seu resultado à atividade desempenhada pelas empresas de aplicativos, como é o caso do assistente admitido nestes autos, o” AirBNB “. É dizer: na medida em que a controvérsia reside apenas na qualificação jurídica que recai sobre os serviços prestados pela recorrente, o resultado do julgamento não seria diverso se ela oferecesse seu imóvel por meio de anúncio em jornal escrito, no quadro de avisos do condomínio ou de qualquer outra forma. Sob outra perspectiva, se acaso estivéssemos afirmando que os vínculos entre a recorrente e os usuários de seu apartamento deram-se sob a forma de locação residencial, mesmo que para temporada, o mero fato de haver sido formalizada por intermédio de um aplicativo não a transformaria em”atividade comercial”, proibida pela convenção do condomínio.” (trecho do voto do Min. Antônio Carlos Ferreira no REsp 1.819.075).
[11] DIREITO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. CONDOMÍNIO EDILÍCIO RESIDENCIAL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER. LOCAÇÃO FRACIONADA DE IMÓVEL PARA PESSOAS SEM VÍNCULO ENTRE SI, POR CURTOS PERÍODOS. CONTRATAÇÕES CONCOMITANTES, INDEPENDENTES E INFORMAIS, POR PRAZOS VARIADOS. OFERTA POR MEIO DE PLATAFORMAS DIGITAIS ESPECIALIZADAS DIVERSAS. HOSPEDAGEM ATÍPICA. USO NÃO RESIDENCIAL DA UNIDADE CONDOMINIAL. ALTA ROTATIVIDADE, COM POTENCIAL AMEAÇA À SEGURANÇA, AO SOSSEGO E À SAÚDE DOS CONDÔMINOS. CONTRARIEDADE À CONVENÇÃO DE CONDOMÍNIO QUE PREVÊ DESTINAÇÃO RESIDENCIAL. RECURSO IMPROVIDO. 1. Os conceitos de domicílio e residência ( CC/2002, arts. 70 a 78), centrados na ideia de permanência e habitualidade, não se coadunam com as características de transitoriedade, eventualidade e temporariedade efêmera, presentes na hospedagem, particularmente naqueles moldes anunciados por meio de plataformas digitais de hospedagem. 2. Na hipótese, tem-se um contrato atípico de hospedagem, que se equipara à nova modalidade surgida nos dias atuais, marcados pelos influxos da avançada tecnologia e pelas facilidades de comunicação e acesso proporcionadas pela rede mundial da internet, e que se vem tornando bastante popular, de um lado, como forma de incremento ou complementação de renda de senhorios, e, de outro, de obtenção, por viajantes e outros interessados, de acolhida e abrigo de reduzido custo. 3. Trata-se de modalidade singela e inovadora de hospedagem de pessoas, sem vínculo entre si, em ambientes físicos de estrutura típica residencial familiar, exercida sem inerente profissionalismo por aquele que atua na produção desse serviço para os interessados, sendo a atividade comumente anunciada por meio de plataformas digitais variadas. As ofertas são feitas por proprietários ou possuidores de imóveis de padrão residencial, dotados de espaços ociosos, aptos ou adaptados para acomodar, com certa privacidade e limitado conforto, o interessado, atendendo, geralmente, à demanda de pessoas menos exigentes, como jovens estudantes ou viajantes, estes por motivação turística ou laboral, atraídos pelos baixos preços cobrados. 4. Embora aparentemente lícita, essa peculiar recente forma de hospedagem não encontra, ainda, clara definição doutrinária, nem tem legislação reguladora no Brasil, e, registre-se, não se confunde com aquelas espécies tradicionais de locação, regidas pela Lei 8.245/91, nem mesmo com aquela menos antiga, genericamente denominada de aluguel por temporada (art. 48 da Lei de Locações). 5. Diferentemente do caso sob exame, a locação por temporada não prevê aluguel informal e fracionado de quartos existentes num imóvel para hospedagem de distintas pessoas estranhas entre si, mas sim a locação plena e formalizada de imóvel adequado a servir de residência temporária para determinado locatário e, por óbvio, seus familiares ou amigos, por prazo não superior a noventa dias. 6. Tampouco a nova modalidade de hospedagem se enquadra dentre os usuais tipos de hospedagem ofertados, de modo formal e profissionalizado, por hotéis, pousadas, hospedarias, motéis e outros estabelecimentos da rede tradicional provisora de alojamento, conforto e variados serviços à clientela, regida pela Lei 11.771/2008. 7. O direito de o proprietário condômino usar, gozar e dispor livremente do seu bem imóvel, nos termos dos arts. 1.228 e 1.335 do Código Civil de 2002 e 19 da Lei 4.591/64, deve harmonizar-se com os direitos relativos à segurança, ao sossego e à saúde das demais múltiplas propriedades abrangidas no Condomínio, de acordo com as razoáveis limitações aprovadas pela maioria de condôminos, pois são limitações concernentes à natureza da propriedade privada em regime de condomínio edilício. 8. O Código Civil, em seus arts. 1.333 e 1.334, concede autonomia e força normativa à convenção de condomínio regularmente aprovada e registrada no Cartório de Registro de Imóveis competente. Portanto, existindo na Convenção de Condomínio regra impondo destinação residencial, mostra-se indevido o uso de unidades particulares que, por sua natureza, implique o desvirtuamento daquela finalidade ( CC/2002, arts. 1.332, III, e 1.336, IV). 9. Não obstante, ressalva-se a possibilidade de os próprios condôminos de um condomínio edilício de fim residencial deliberarem em assembleia, por maioria qualificada (de dois terços das frações ideais), permitir a utilização das unidades condominiais para fins de hospedagem atípica, por intermédio de plataformas digitais ou outra modalidade de oferta, ampliando o uso para além do estritamente residencial e, posteriormente, querendo, incorporarem essa modificação à Convenção do Condomínio. 10. Recurso especial desprovido. ( REsp n. 1.819.075/RS, relator Ministro Luis Felipe Salomão, relator para acórdão Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 20/4/2021, DJe de 27/5/2021.)
[12] RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. AÇÃO DE ANULAÇÃO DE ASSEMBLEIA CONDOMINIAL. CONVENÇÃO. DESTINAÇÃO EXCLUSIVAMENTE RESIDENCIAL. PREVISÃO. LOCAÇÃO. PRAZO INFERIOR A 90 (NOVENTA) DIAS. PROIBIÇÃO. POSSIBILIDADE. FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE. ART. 1.336, IV, DO CÓDIGO CIVIL. USO DE PLATAFORMAS DIGITAIS. ASPECTO IRRELEVANTE. 1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ). 2. Delimitação da controvérsia: saber se os condomínios residenciais podem ou não fixar tempo mínimo de locação das unidades autônomas ou até mesmo impedir a utilização de determinado meio para tal finalidade, a exemplo das plataformas digitais de hospedagem. 3. A disponibilização de espaços ociosos para uso de terceiros, seja de um imóvel inteiro ou de um único cômodo, pode ocorrer das mais variadas formas: por meio de plataformas digitais, por intermédio de imobiliárias, por simples panfletos afixados nas portarias dos edifícios, anúncios em classificados etc. 4. A forma por meio da qual determinado imóvel é disponibilizado para uso de terceiros não é o fator decisivo para que tal atividade seja enquadrada em um ou outro regramento legal. 5. A disponibilização de imóveis para uso de terceiros por meio de plataformas digitais de hospedagem, a depender do caso concreto, pode ser enquadrada nas mais variadas hipóteses existentes no ordenamento jurídico, sobretudo em função da constante expansão das atividades desenvolvidas por empresas do gênero. 6. Somente a partir dos elementos fáticos delineados em cada hipótese submetida à apreciação judicial – considerados aspectos relativos ao tempo de hospedagem, ao grau de profissionalismo da atividade, à destinação exclusiva do imóvel ao ocupante ou o seu compartilhamento com o proprietário, à destinação da área em que ele está inserido (se residencial ou comercial), à prestação ou não de outros serviços periféricos, entre outros – é que se afigura possível enquadrar determinada atividade em alguma das hipóteses legais, se isso se mostrar relevante para a solução do litígio. 7. O enquadramento legal da atividade somente se mostra relevante quando se contrapõem em juízo os interesses do locador e do locatário, do hospedeiro e do hóspede, enfim, daquele que disponibiliza o imóvel para uso e do terceiro que o utiliza, visando, com isso, definir o regramento legal aplicável à relação jurídica firmada entre eles. 8. Diversa é a hipótese em que o conflito se verifica na relação entre o proprietário do imóvel que o disponibiliza para uso de terceiros e o próprio condomínio no qual o imóvel está inserido, atingindo diretamente os interesses dos demais condôminos. 9. A exploração econômica de unidades autônomas mediante locação por curto ou curtíssimo prazo, caracterizada pela eventualidade e pela transitoriedade, não se compatibiliza com a destinação exclusivamente residencial atribuída ao condomínio. 10. A afetação do sossego, da salubridade e da segurança, causada pela alta rotatividade de pessoas estranhas e sem compromisso duradouro com a comunidade na qual estão temporariamente inseridas, é o que confere razoabilidade a eventuais restrições impostas com fundamento na destinação prevista na convenção condominial. 11. O direito de propriedade, assegurado constitucionalmente, não é só de quem explora economicamente o seu imóvel, mas sobretudo daquele que faz dele a sua moradia e que nele almeja encontrar, além de um lugar seguro para a sua família, a paz e o sossego necessários para recompor as energias gastas ao longo do dia. 12. Recurso especial não provido. ( REsp n. 1.884.483/PR, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 23/11/2021, REPDJe de 02/02/2022, DJe de 16/12/2021.)
Fonte: JusBrasil.
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