Uma síndica, em Belo Horizonte, está no cargo há mais de 40 anos. A lei permite. Síndicos podem ser eleitos para um mandato de dois anos, renovável por igual período indefinidamente. O condomínio que ela administra tem 5 mil moradores. Cerca de 23% dos 5.569 municípios do Brasil tem população equivalente. Ou menos. 

A alternância no poder é base da democracia liberal. Junto com as assembleias representativas e as eleições periódicas. A síndica do condomínio mineiro não é uma tirana. Talvez tenha permanecido no cargo porque nenhum outro tenha se apresentado para substitui-la. Lidar com moradores no dia-a-dia não é mesmo tarefa fácil. Há quem prefira castigos menos agradáveis. Evisceração, empalamento e autoflagelação são os que me ocorrem.

De qualquer forma, é tempo demais. As semelhanças do cargo de síndico com o de governante são evidentes. O legislador que dispôs regras para a eleição do síndico, pensou em voto, mandato, recondução e impeachment. Tudo em um pacote só.

Se um síndico pode sofrer impedimento, tal como um presidente ou um governador, ele pode muito bem cometer crimes de responsabilidade. É preciso comparar.

A democracia é um jogo em que um perde e outro ganha, mas todos obedecem. É uma questão de confiança. Uma assembleia de condomínio elege o seu síndico, certa de que poderá trocá-lo durante ou ao fim do mandato. Os mecanismos legais estão à disposição. Mas o fato de ter sido eleito pela maioria dá a ele amplos poderes. Síndico não é empregado, é representante legal. Síndico não é assalariado, recebe honorários.

A possibilidade de que se reeleja “ad infinitum”, no entanto, é mesmo discutível. Os EUA, que inventaram o presidencialismo, resolveram limitar o mandato de presidente a dois depois que Franklin Delano Roosevelt foi eleito por quatro vezes seguidas.

O argumento se baseia na ideia de que uma coalizão significativa que perdure ao longo do tempo – entre síndico, subsíndico e condôminos, por exemplo – possa prejudicar minorias significativas. Por isso a necessidade de alternância no poder.

Internada em um hospital em estado grave, a síndica do condomínio de Belo Horizonte não deve participar das próximas eleições, mas seu irmão já pleiteia o cargo. Moradores denunciam que há um movimento para tentar impedir a formação de uma chapa de oposição com a circulação de bilhetinhos e mensagens apócrifos e caluniosos.

Paul Biaya, presidente da República de Camarões há mais de cinco décadas, encontra-se em situação semelhante. Aos 92 anos, ele está internado em estado grave, mas proibiu que a imprensa especule sobre sua saúde. Em 2008, ele eliminou o limite de mandatos na Constituição para permanecer mais tempo no poder. É preciso comparar.

Escrito por:

Marcus Gomes - Marcus Gomes é redator da editora Bonijuris, editor da Agência Expresso e colunista do portal Viva o Condomínio. Trabalhou nos jornais Gazeta do Povo, O Globo e no site UOL. Foi correspondente no Mundial de Futebol da Coréia do Sul e do Japão, em 2002.

Assine a newsletter do Viva e receba
notícias como esta no seu e-mail

    Comente essa postagem

    O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos marcados com * são obrigatórios.

    Seu comentário será moderado pelo Viva o Condomínio e publicado após sua aprovação.