Aquisição de unidade autônoma em benefício dos condôminos
a) O Condomínio pode adquirir unidades autônomas? Em caso afirmativo, qual o quórum para aprovação em assembleia e se existe alguma outra exigência.
b) O Condomínio pode alugar estas unidades? Em caso afirmativo, qual o quórum para aprovação em assembleia e se existe alguma outra exigência.
Inicialmente duas questões precisam ser consideradas:
1ª) se a ‘ausência de personalidade jurídica do condomínio edilício’ impede ou não o reconhecimento de sua capacidade para aquisição de imóvel em benefício de toda a coletividade de condôminos e se haveria vedação ao registro imobiliário.
2ª) se haverá alteração da ‘destinação’ das unidades autônomas, considerando a previsão na convenção condominial e qual seria o quórum de aprovação.
O artigo 44 do Código Civil arrola as pessoas jurídicas de direito privado, não contemplando o Condomínio Edilício. Não obstante alguns doutrinadores neguem a ampla personalidade jurídica ao condomínio com amparo exclusivo na falta de previsão legal, não há controvérsia a respeito de o condomínio possuir CNPJ, ter conta em banco, praticar atos administrativos. Mas há controvérsia acerca da possibilidade do condomínio edilício adquirir bens em nome próprio.
A doutrina e a jurisprudência registram posições diversas, tanto no sentido de negar quanto no de reconhecer a possibilidade de o condomínio adquirir bens em nome próprio, havendo julgados de diversos Tribunais Pátrios em ambos os sentidos.
Na I Jornada de Direito Civil do CEJ do CJF aprovou-se o seguinte enunciado, de nº90:
“Admite-se a personalidade jurídica ao condomínio, desde que em atividade de seu peculiar interesse”.
Em reunião mais recente, a mesma Jornada aprovou enunciado mais amplo (Enunciado n. 246): “Fica alterado o Enunciado n. 90, com supressão da parte final: ‘nas relações jurídicas inerentes às atividades de seu peculiar interesse’. Prevalece o texto: ‘Deve ser reconhecida personalidade jurídica ao condomínio edilício’”.
A Lei 4.591/64 em plena vigência, prevê no seu artigo 63, §3º, a possibilidade de adjudicação de bens pelo condomínio, com preferência em relação a terceiros, após a realização de leilões, no específico caso de cobrança de débito existente pela falta de pagamento de três prestações do preço por um dos condôminos relativo à construção de prédio por administração.
Diante desta exceção decorre a conclusão lógica, de que a ausência de personalidade jurídica não constitui óbice à aquisição de imóveis pelo condomínio edilício.
Na discussão entre a técnica e o pragmatismo, no caso concreto, deve prevalecer o pragmatismo, a solução deve atender às circunstâncias (atender às necessidades da vivência em condomínio). A omissão do legislador não pode impedir a solução das questões complexas que envolvem os condomínios. É razoável não impor rigor à norma a fim de viabilizar a atuação do condomínio na vida social. O intérprete do direito deve acompanhar as transformações na realidade social, evitando-se que a tentativa de enquadrar os fatos em categorias ultrapassadas leve a decisões injustas e incompatíveis com o escopo da norma.
Feitas tais ponderações, considerando que o condomínio pode estar devidamente registrado no CNPJ/MF e que pretenda adquirir imóvel que já integra fisicamente o próprio condomínio (unidades autônomas da propriedade de terceiros), que passarão a integrar a propriedade comum dos condôminos, consideramos que é possível a referida aquisição (compra), inclusive com a possibilidade do registro em nome próprio, observadas as mesmas formalidades necessárias ao primeiro registro da área comum, conforme o art. 1.332, inciso II, do Código Civil. Considerando-se que para o registro do condomínio é necessária a determinação da fração ideal atribuída a cada unidade (CC, art. 1.332, II), então a alteração da área comum deverá igualmente ser levada a registro, com as mesmas especificações, ou seja, discriminando a compropriedade de cada condômino.
Uma lacuna legal não pode ferir o direito do condomínio, assim como a sua capacidade de adquirir imóveis que somente servirão para suas atividades fins e reverterão em proveito único e exclusivo dos condôminos, em favor do bem comum.
Importante destacar que na convenção de condomínio edilício há a necessidade de indicação precisa da unidade imobiliária, ou seja, com todas as suas características, metragens etc. Desse modo, uma vez adquirido o imóvel, convertido em área comum, configuram-se modificações no bem que precisam ser atualizadas junto à convenção do condomínio, para efeito de registro imobiliário.
Quanto ao quórum exigido para aprovação da aquisição e alterações, para modificar a convenção, dispondo acerca de alterações de área do condomínio, dependerá de aprovação de 2/3 do voto dos condôminos, nos termos do art. 1.351 do CC.
Art. 1351. Depende da aprovação de 2/3 (dois terços) dos votos dos condôminos a alteração da convenção; a mudança da destinação do edifício, ou da unidade imobiliária, depende da aprovação pela unanimidade dos condôminos. (NR) (Artigo com redação determinada na Lei nº 10.931, de 2.8.2004, DOU 3.8.2004).
Para realização de obras em partes comuns do edifício, se faz necessária a aprovação de 2/3 dos votos dos condôminos, conforme art. 1.342 Código Civil.
Realizando a interpretação conjunta dos artigos 1.332, 1.333 e 1.351, primeira parte, do Código Civil, tem-se que, sempre que a unidade imobiliária sofrer alguma alteração, como ocorre na hipótese, faz-se necessária a aprovação da alteração da convenção pelo quórum de aprovação de 2/3 dos votos dos condôminos.
Caso entendido que o condomínio busca alterar a ‘destinação’ das unidades autônomas, aplicar-se-ia, à hipótese, o artigo 1.351 do Código Civil, segunda parte.
Em vista do que dispõe o artigo 1.333 c/c artigo 1.351, primeira parte, ambos do Código Civil, tem-se que a convenção que constitui o condomínio edilício deve ser subscrita pelos titulares de, no mínimo, 2/3 das frações ideais, razão pela qual não há razão de exigir que sua alteração se faça por um quórum maior. Com base nesse raciocínio, considera-se que não há necessidade de se exigir quórum unânime para a aprovação através de assembleia.
Tampouco aplica-se o disposto no artigo 1.343 do Código Civil, segundo o qual: “A construção de outro pavimento, ou, no solo comum, de outro edifício, destinado a conter novas unidades imobiliárias, depende de aprovação da unanimidade dos condôminos”.
No caso, não importa em construção que venha agregar outro pavimento ou novas unidades imobiliárias ao edifício, pelo que não se aplica tal dispositivo, e, com isso, não se aplica a exigência de quórum de aprovação unânime dos demais condôminos.
Enseja a aplicabilidade do disposto no artigo 1.342 do Código Civil (aprovação por 2/3 dos votos dos condôminos), por analogia, principalmente porque haverá alteração de área comum, com a realização de obras que vão alterar o projeto original do condomínio.
Adverte-se que a questão ora tratada não é pacífica. É possível que na hipótese de compra do imóvel e conversão em área comum, o registro de imóveis recuse promover o registro, suscitando dúvida que, sendo o caso, seria decidida no âmbito do Poder Judiciário. O motivo da recusa, tem sido no fato da ausência de personalidade jurídica do condomínio (acima tratada). Mesmo diante da possibilidade de compra e venda ou locação por ausência de norma proibitiva, faltaria essa possibilidade em virtude de lacuna legal quanto à personalidade jurídica do condomínio.
Vale registrar que há quem entenda que a decisão unânime dos condôminos poderia legitimar a pretensão de compra ou locação de unidades autônomas. Ou seja, a unanimidade supriria a ausência de personalidade jurídica do condomínio.
Escrito por:
JOSÉLIA APARECIDA KÜCHLER
ADVOGADA – OAB/PR 21.674, Pós-Graduada em Direito Cível e Administrativo. Atua como advogada há 25 anos, nos ramos de Direito Comercial e Cível, com ênfase no âmbito do Direito Imobiliário.
Whatsaap: 41 9 9964-9638.
Instagram: @joseliakuchler
e-mail: joseliakuchler@gmail.com
Escrito por:Comente essa postagem
O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos marcados com * são obrigatórios.
Seu comentário será moderado pelo Viva o Condomínio e publicado após sua aprovação.