Publicado em 20 de janeiro de 2022

Reunião de Condomínio? Include me out.

Reunião de Condomínio? Include me out. Acompanhe-me mais um pouco, o artigo acaba logo, muito mais rápido que reunião de condomínio.

Vamos, confesse! Com um título desses não dá nem vontade de ler o artigo. Assunto desconfortável, não? Difícil imaginar por que eu teria escolhido tratar de um tema tão desagradável. A razão é exatamente esta. Acompanhe-me mais um pouco, o artigo acaba logo, muito mais rápido que reunião de condomínio.

 

Reunião de Condomínio? Include me out.

 

Faça um levantamento no seu prédio. Descobrirá o baixíssimo nível de frequência, e a falta de pontualidade dos poucos que comparecem às sessões. Sempre agendadas e comunicadas, por lei, com vários dias de antecedência.

Mas, todo mundo tem uma desculpa. 

Pôxa, esqueci, é certamente a pior. Não é a memória que nos trai, mas a falta de desejo que nos faz querer esquecer. E esquecer mesmo. Ou fingir que esqueceu. 

Tinha outro compromisso importante, não podia faltar, é uma desculpa um pouco melhor. Mas, a quem convence? Priorizamos os compromissos que nos interessam e, convenhamos, ninguém tem interesse em reunião de condomínio

Quiçá o síndico. Muitas vezes, nem ele. Quem sabe, apenas a velhinha do 52, cujo único evento social para o qual ainda é convidada e tem o prazer de comparecer são as essas reuniões.

Perdão, perdão. Estava cometendo uma grave injustiça. Esqueci a Dona Aurora. No meu prédio ela mora no 22, no seu eu não sei. Sim, quero dizer que sempre tem uma Dona Aurora ou um clone dela, em todo condomínio. Quer conferir? É fácil.

Dona Aurora é um sargento. Não, ela não é militar. Por pouco.  Até queria fazer o Exército, mas no tempo dela mulher não podia servir, mas isto é outra história. 

Acabou sendo Diretora de Escola. Pública. Na periferia. Durona. Enfrentou barras pesadas. Teve até que enfrentar aluno armado. Uma vencedora. Pendurou as chuteiras lá e agora é co-síndica. Não! Ela não é a sub-síndica, oficialmente eleita pela maioria dos presentes, porque a maioria mesmo não compareceu, em ocasião apropriada e registrada em ata. Dona Aurora  é síndica honorária. Por opção e por vocação, eleita por si mesma.

Ela realmente adora reunião de condomínio, pois, segundo diz, é o dia em que vamos colocar ordem nas coisas por aqui. Se a pauta oficial tem 3 itens, a pauta dela tem 21. 

 

Em todas as reuniões ela tem comentários bastante para afetar a qualquer um dos outros condôminos. Inclui problemas com: 
  • Bebês, crianças, adolescentes, jovens, casais de namorados, recém-casados, casados, divorciados,  descasando, e afins;
  • Cachorros, gatos, hamsters, papagaio e outros animais de estimação; 
  • Faxineira, empregada, diaristas, porteiro, zelador, e afins;
  • Carros, motos, bicicletas, patins, skates e quaisquer outros meios de locomoção;
  • O apartamento dela, o do vizinho de cima, o do de baixo, o do lado esquerdo e do direito;   
  • A calçada, o portão, o jardim, a recepção, o playground, a garagem.

E a lista não tem fim.  

Parece com alguém que mora no seu prédio? Viu?! Eu não disse que tinha uma Dona Aurora aí?

Bem, mas não fujamos do assunto principal: por que reuniões de condomínio são tão indesejáveis. Penso que o motivo principal seja: por nossa causa.

Não, não se assuste nem fique ofendido. Quando digo nossa causa, me refiro, a  mim, a você, ao síndico, a velhinha do 52, a Dona Aurora, os poucos que vêm e os muitos que faltam. Todos nós. 

 

Primeiro. Não compreendemos corretamente o que é viver em comunidade. Parece ser de nossa cultura, o gostar muito de gente, de festejar, de reunir 200 mil de pessoas na rua dançando Carnaval. Mas quando se fala de conviver… Aí é cada um na sua. Cada um por si. E ninguém por ninguém. Quando nos juntamos em comunidade, aí vai tudo pro ralo. 

Não gostamos, e verdadeiramente ainda não sabemos pensar no coletivo. O que na cultura japonesa é tão profundo, que até pode nos parecer excessivo, na nossa é totalmente desprezado. Aqui, vale mais o cada um por si e deixarmos a Deus o ser por todos.

Quanto tempo vamos levar para amadurecer e entender que viver em sociedade é viver com o outro e para todos? Que varrer o lixo para a calçada do vizinho não é esperteza, é deixar a nossa rua suja do mesmo jeito. Que não tem esta “de o furo é no seu lado do barco, problema seu”. Compreender a existência de um só barco, e que qualquer furo é sempre um furo no nosso barco. E o risco é de todos naufragarmos.

 

Segundo. Não sabemos lidar com a diversidade. Não suportamos a ideia de conviver e compartilhar de nossa vida privada publicamente se me perdoarem a aparente contradição. 

Temos uma imensa dificuldade de aceitar que o outro é diferente de nós, esquecendo que nós somos diferentes para o outro. Esquecendo que ser síndico não é só ser chato; é chato. 

É chato receber ligação do 201, às 2 da manhã, reclamando do barulho do 301 e ter que ligar para o 301, e ouvir as reclamações dele sobre o 401. É chato ter que de avisar aos pais que as crianças estão ralando os carros com as bicicletas e ouvir dos mesmos pais que as crianças (as dos outros) estão ralando seus carros com as bicicletas. 

É chato, mas alguém tem de assumir esta obrigação. E a nossa, é compreender quão difícil e incômoda ela é, e sermos mais agradecidos para com quem a exerce.

Sei como é complicado aguentar as perguntas sempre óbvias da velhinha do 52. Concordo.  Mas, nossa disposição de ouvi-la vai mudar quando nos conscientizamos que quando ela nasceu não havia nem TV a Cabo, nem internet banda-larga. 

Entender que já que ela vai participar da instalação dessas benesses tecnológicas com uma porção importante de sua pensão, é justo que possa esclarecer as suas dúvidas. 

Em momentos como esses, precisamos nos lembrar de nosso destino menos dramático, já que a alternativa é morrermos jovens, é envelhecermos e nos tornarmos os velhinhos do 52.

Sei também como é complicado conviver com a Dona Aurora, mas não que seja impossível. 

Principalmente se ela se conscientizar que não mora mais naquela casa de bairro, tranquila, isolada dos dois lados, que ela trocou pela segurança e pelo preço social de morar em apartamento; e se nós reconhecermos como positiva a sua colaboração para que a coisa não vire bagunça. Pois, na realidade, muito do que tanto prezamos de ordem e limpeza no condomínio, não aconteceria se ela não estivesse lá pegando no pé de todo mundo.

Afinal, reunião de condomínio não é diferente de viver em condomínio, e não é diferente de viver em sociedade, nem de trabalhar em uma organização ou de ser parte de uma equipe. 

Exige a determinação de participar com o melhor de si para o coletivo, de abrir mão de algumas prerrogativas, de olhar a situação sob o ponto de vista do outro, de aceitar a diversidade, de respeitar limitações pessoais e limites territoriais (teto para um é piso para outro) e visar sempre o bem estar coletivo.

Assim, ao encarar a próxima reunião no seu condomínio, na sua empresa, na sua escola, na associação de bairro, no clube, no Plenário da Câmara, ou com sua família  tenha outros olhos, uma nova disposição. Participe, contribua de forma positiva e aprenda um pouco mais sobre o lado humano da vida. 

Afinal, como dizia a música daquele filme antigo, Horizonte Perdido, o mundo é um círculo e, tudo o que você faz, reflete em você. 

 

 

Escrito por:
Eduardo Cupaiolo – Fundador e Presidente da PeopleSide Human and Organizational Development, autor do livro “Contrate Preguiçosos”, palestrante e articulista de diversos veículos nacionais e internacionais.

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